sábado, 25 de agosto de 2007

VAMOS COMEMORAR JUNTOS!!!


NIVER DA NOSSA FACILITADORA URSULA BOECK...


sábado, 4 de agosto de 2007

OBSERVADOS NAS SESSÕES DO CIEPRE


OBSERVAÇÃO EM PSICOMOTRICIDADE

OBJETO DE ESTUDO DA PSICOMOTRICIDADE
A globalidade da pessoa, considerada no seu todo

TAREFA DA PSICOMOTRICIDADE


conectar
- a inteligência
- a corporalidade
- a afetividade
- a socialização

Observação


Direta – contato direto com a criança

Participante – interação e intervenção

Disposição emotiva interior de receptividade e de escuta, de tudo que vem do outro

Trata-se de assumir dentro de si o objeto, de o acolher e de o conter

Receptividade

Capacidade de silêncio e escuta, como espaço para acolher e conter o objeto na sua totalidade

Evitando um dos maiores riscos da observação, que é o de ver só uma parte, um setor e não a pessoa como um todo, na sua unidade.

Observar


Recolher aspectos da individualidade

Da unicidade do outro com toda a nossa pessoa e não só com nosso conhecimento

Distância ajustada


Movimento interno de estar próximo e distante emotivamente

Capacidade de observar e escutar-se a si próprio


Recolher os significados mais profundos


Observar dentro de si e nos outros o impulso de crescer


Desenvolver a capacidade de recolher os processos evolutivos presentes nas pessoas


Garantir para a criança o seu espaço de ação


O psicomotricista que observa não é e não pode ser um registrador indiferente ao evento


Mas uma pessoa dotada de emoções, sentimentos, conhecimentos


Que necessariamente fazem parte da experiência observativa, que foi intermediada pela percepção, intuição e introspecção.

PAUTAS DE OBSERVAÇÃO


Quando se trabalha com a Psicomotricidade relacional nas sessões com as crianças portadoras de necessidades educacionais, existem algumas pautas que nos ajudam a direcionar melhor o trabalho de observação. Entre algumas estão:



















































sexta-feira, 3 de agosto de 2007

ESQUEMA CORPORAL


Importância do corpo e conceito de esquema corporal

O corpo é uma forma de expressão da individualidade. A criança percebe-se e percebe as coisas que a cercam em função de seu próprio corpo. Isto significa que, conhecendo-o, terá maior habilidade para se diferenciar, para sentir diferenças. Ela passa a distingui-lo em relação aos objetos circundantes, observando-os, manejando-os.
O desenvolvimento de uma criança é o resultado da interação de seu corpo com os objetos de seu meio, com as pessoas com quem convive e com o mundo onde estabelece ligações afetivas e emocionais.
O corpo, portanto, é a sua maneira de ser. É através dele que estabelece contato com as entidades do mundo, que se engaja no mundo, que compreende os outros.
Todo ser tem seu mundo construído a partir de suas próprias experiências corporais. Morizot, em sua palestra proferida no I Congresso Brasileiro de Psicomotricidade, afirma:

Toda relação corporal implica uma relação psicológica, pois o movimento não é um processo isolado e está em estreita relação com a conduta e a personalidade.

O corpo deve ser entendido não somente como algo biológico e orgânico que possibilita a visão, a audição, o movimento, mas é também um lugar que permite expressar emoções e estados interiores. A este respeito Vayer(1984, p. 30) afirma:

Todas as experiências da criança (o prazer e a dor, o sucesso ou o fracasso) são sempre vividos corporalmente. Se acrescentarmos valores sociais que o meio dá ao corpo e a certas de suas partes, este corpo termina por ser investido de significações, de sentimentos e de valores muito particulares e absolutamente pessoais.






Para uma criança agir através de seus aspectos psicológicos, psicomotores, emocionais, cognitivos e sociais, precisa ter um corpo “organizado”. Essa organização de si mesma é o ponto de partida para que descubra suas diversas possibilidades de ação e, portanto, precisa levar em consideração aspectos neurofisiológicos, mecânicos, anatômicos, locomotores.
Concordamos com Picq e Vayer (1985) quando afirmam que esta organização de si envolve uma percepção e controle do próprio corpo através da interiorização das sensações. Isto quer dizer que a criança aprende a conhecer e a diferenciar seu corpo como um todo e também a sentir suas possibilidades de ação. Ela precisa, também, adquirir um equilíbrio econômico e postural, uma lateralidade bem definida, uma independência dos diferentes segmentos corporais e um domínio das pulsões e das inibições.

A expressão esquema corporal nasceu em 1911 com o neurologista Henry Head, tendo cunho essencialmente neurológico. Segundo ele (Head, in Quiros e Della Cella, 1973), o córtex cerebral recebe informações das vísceras, das sensações e percepções táteis, térmicas, visuais, auditivas e das imagens motrizes, o que facilitaria a obtenção de uma noção, um modelo e um esquema de seu corpo e das suas posturas. Head ainda afirma que o esquema corporal armazena não só as impressões presentes como também as passadas.
Já Schilder (1958, p. 15) parte das idéias de Head para desenvolver as suas. Ultrapassando a realidade neuropsicológica, chega ao conceito de imagem corporal que seria uma representação mental de nosso corpo e não constitui uma mera percepção mas uma “integração de diferentes gestalten”. Schilder também supôs “a existência de uma gestalten biológica e uma gestalten em contínua modificação como participante da imagem corporal”. “O esquema corporal [para ele] é a imagem tridimensional que todo mundo tem de si mesmo”.
Após Head e Schilder, as idéias sobre esquema e a imagem corporal foram evoluindo. Vayer (1984, p. 73) reconhece que são noções muito complexas, e que são compostas de dados “biológicos, interacionais, inter-relacionais, sociais ...”
Tanto Morais (1986) quanto Santos (1987) explicam, de maneira esclarecedora, para nós, os conceitos de imagem, conceito e esquema corporal. Definem imagem do corpo como uma impressão que se tem de si mesmo, subjetivamente, baseada em percepções internas e externas (exemplo; altura, peso, força muscular) e no confronto com outras pessoas do próprio meio social. O conceito de corpo envolve um conhecimento intelectual e consciente do corpo e também da função de seus órgãos.






A criança aprende os conceitos e as palavras correspondentes aos diferentes segmentos e às diferentes regiões do corpo bem como suas funções. A este respeito, Vayer (1982, p. 31) afirma:



Estes conceitos não fazem parte da experiência propriamente dita, são entidades abstratas mais do que processo perceptivo ou afetivo. Mas a existência de tais conceitos influencia, certamente, a experiência corporal.

A nominação das partes do corpo, como diz Ajuriaguerra (1980, p. 343), confirma o que é percebido, reafirma o que é conhecido e permite verbalizar (por um mecanismo de redução) aquilo que é vivenciado.
Na realidade, a criança tem uma representação gráfica da imagem de si. Podemos inferir esta imagem através de seu desenho da figura humana. Por esta razão, quando queremos conhecer a visão da criança sobre si mesmo, pedimos que ela realize um desenho da figura humana.
Morais e Santos também conceituam o esquema corporal dizendo que resulta das experiências que possuímos, provenientes do corpo e das sensações que experimentamos. Por exemplo: andar, sentar-se, segurar o lápis ou a caneta de modo correto, com equilíbrio e com movimentos coordenados, depende de uma noção adequada do esquema corporal. O esquema corporal, portanto, regula a postura e o equilíbrio.

Defontaine (1980, vol. 3) compara a imagem corporal a um conhecimento “geográfico” que uma criança possa ter. Através da interiorização, a criança torna-se capaz de se situar. O esquema corporal, para ele, é um conhecimento imediato do corpo estático ou em movimento, e suas relações com as partes do corpo, com o espaço e com os objetos circundantes.
Uma grande preocupação para todos aqueles que lidam com crianças deveria ser ajudá-las a usar seu corpo para aprender os elementos do mundo que as envolve e estabelecer relações entre eles, isto é, auxiliara a desenvolver a inteligência.
É necessário, também, que o educador auxilie seus alunos no sentido de fazê-los centrarem sua atenção sobre si mesmos para uma maior interiorização do corpo. A interiorização é um fator muito importante para que a criança possa tomar consciência de seu esquema corporal. Pela interiorização, a criança volta-se para si mesma, possibilitando uma automatização das primeiras aquisições motoras. A criança que não consegue interiorizar seu corpo pode ter problemas tanto no plano gnosiológico, como no práxico.
Lê Boulch (1984) afirma que esta interiorização torna possível uma dissociação de movimentos que permite um maior controle das praxias. No plano gnosiológico, percebemos que a interiorização garante uma representação mental do seu corpo, dos objetos e do mundo em que vive.

Esta representação mental é responsável pelo aparecimento do membro fantasma. O membro fantasma é a ilusão de que um membro amputado ainda está presente com suas sensações de presença, de volume, de movimento. No lugar do membro, a pessoa sente dor, frio, enfim, sente sua ligação com o resto do corpo.
Ajuriaguerra (1980) diz que isto se deve a um resíduo cinestésico do membro (ou parte do corpo) fisicamente ausente. É uma experiência subjetiva que uma mutilação corporal consegue mudar.
Schilder (1958) explica que existe uma base fisiológica que facilita o conhecimento do corpo; o corpo tem, portanto, um exterior (corpo físico, o que todos vêem) e um interior que seria a representação mental de seu corpo próprio.
Fonseca e Mendes (1987, p. 63), estudando este fenômeno, declaram que o mesmo se deve à persistência de uma consciência do corpo em sua totalidade. Para eles, a existência de um membro fantasma vem comprovar a existência de um conjunto superiormente estruturado nas áreas motoras e sensitivo-somáticas do córtex humano, significando que


(...) para cada área motora corresponde uma área sensitiva associada. A ausência súbita de qualquer elemento do corpo corresponde, sem dúvida, a uma ausência física (e das respectivas inervações motoras) mas permanece a ilusão mental sentida no membro amputado, isto é, o amputado continua a sentir o membro mutilado, através da respectiva representação não só de ordem cinestésica como também (e até) de ordem simbólica.

Um esquema corporal organizado, portanto, permite a uma criança se sentir bem, na medida em que seu corpo lhe obedece, em que tem domínio sobre ele, em que o conhece bem, em que pode utilizá-lo para alcançar um maior poder cognitivo. Ela deve ter o domínio do gesto e do instrumento que implica em equilíbrio entre as forças musculares, domínio de coordenação global, boa coordenação óculo-manual.

É importante ressaltar que o corpo é o ponto de referência que o ser humano possui para conhecer e interagir com o mundo. Este ponto de referência servirá de base para o desenvolvimento cognitivo, para aprendizagem de conceitos tão importantes para uma boa alfabetização como, por exemplo, os conceitos de espaço: embaixo, em cima, ao lado, atrás, direita, esquerda etc. Primeiramente a criança visualiza estes conceitos através de seu corpo e só depois consegue visualiza-los nos objetos entre si. Seu corpo também está inserido em um tempo e isto irá permitir situa-la melhor no mundo em que se encontra. Este ponto de referência vai permitir também uma inibição voluntária ( a criança inibe seu movimento na hora em que precisar e que quiser). Ela domina seus gestos ao escrever, domina seu tônus muscular ao imprimir a força adequada para a realização de determinadas tarefas.

DESENVOLVIMENTO DO ESQUEMA CORPORAL


CONSIDERAÇÕES GERAIS
O esquema corporal não é um conceito aprendido, que se possa ensinar, pois não depende de treinamento. Ele se organiza pela experienciação do corpo da criança. Como já afirmamos anteriormente, é uma construção mental que a criança realiza gradualmente, de acordo com o uso que faz de seu corpo. É um resumo e uma síntese de sua experiência corporal.
A criança nasce com uma bagagem de sensações e percepções proprioceptivas, mas, por falta de mielinização das fibras nervosas, não consegue organizá-la. Na medida em que há maior amadurecimento do sistema nervoso, ela vai podendo distinguir, por exemplo, que o desconforto que sentia anteriormente é proveniente de fome ou dor. Assim, desde o nascimento, vai gradualmente organizando as diversas sensações que vão surgindo. Guillarme (1983, p. 39) traduz muito bem este pensamento:

O esquema corporal ... não tem nada a ver com a tomada de consciência sucessiva de elementos distintos, os quais, como num quebra-cabeça, iriam pouco a pouco encaixar-se uns nos outros para compor um corpo completo a partir de um corpo desmembrado. O esquema corporal revela-se gradativamente à criança, da mesma forma que uma fotografia revelada na câmara escura mostra-se pouco a pouco para o observador, tomando contorno, forma e uma coloração cada vez mais nítidos.

Ao nascer, a criança tem como principal fonte de conhecimento a boca e através dela recebe sensações de calor, de frio, de umidade. Passa a levar na boca tudo o que vê e sente, e, assim, vai iniciando seu aprendizado. Sente a pressão executada em seu corpo pelo cobertor, pelo berço, pelo afago das pessoas ao seu redor e vai incorporando este conhecimento. Descobre as mãos, leva-as à boca, brinca com elas; descobre os pés, seu sexo. Sente o poder que tem sobre seu corpo quando, depois de cair e levantar-se diversas vezes, aprende a encontrar seu ponto de equilíbrio e anda. Seu poder torna-se maior quando aprende a controlar seus esfíncteres. Pouco a pouco, então, vai se conhecendo e integrando as diversas sensações que experimenta; apreende o sentimento de mundo através da audição, visão, olfação, sensação de calor, de frio; percebe também sensações provenientes das inervações dos músculos, das vísceras.
Para Defontaine (1980, vol. 10), a criança descobre o seu corpo através das deslocações que normalmente lhe são impostas pela sociedade, desde uma atividade inicial automático-reflexa até adquirir uma capacidade de movimentos dissociados devido ao processo de maturação.
Neste conhecimento de seu corpo, a criança passa por uma experiência, que muitos autores têm preconizado como fundamental para o desenvolvimento do esquema corporal, que é o estágio do espelho, o qual analisaremos a seguir.

IMAGEM ESPECULAR


Trata-se da descoberta pela criança de sua imagem no espelho, o que se dá por volta de seis meses de idade. Inicialmente a criança sente-se surpresa com a imagem que vê. Ás vezes tenta pegar seu reflexo, sorri para ele sem reconhecer que é a sua própria imagem refletida. Ela vê a imagem do adulto que a sustém, sorri para ela e se volta surpresa quando este lhe fala. A representação que ela possui deste adulto vai somando à imagem especular dele.
Aos poucos vai percebendo que o reflexo no espelho é uma representação dela também e passa a se ver de forma global como um ser único. Ela brinca com o espelho, faz caretas, põe a mão na face, nos cabelos, pula, beija o espelho. Cada vez mais vai comparar o que Lê Boulch (1984a) chama de reações posturais e gestuais com seu corpo cinestésico. Isto significa que ela percebe que o corpo que ela sente é o mesmo que ela observa no espelho. Ela deve compreender que está onde se sente e não onde se vê (Wallon).

ZAZZO


Para Zazzo (in Lurçat, 1979), a criança consegue superar a dicotomia entre o que vê e o que sente quando for capaz de compreender que tipo de espaço pode estar representado no espelho e isto só se resolve mais ou menos aos vinte meses. Com dois anos e meio, três anos, ela tem condições de entender que “o espaço que ela sente é o mesmo que ela vê no espelho”. A este respeito, Wallon mostra que o eu exteroceptivo fornecido pelo espelho vem se juntar ao eu proprioceptivo, num processo tônico-postural.
Gradualmente, portanto, ela apreende sua imagem especular como um reflexo, uma imagem, uma representação, um símbolo.
Já o animal não consegue ultrapassar a visão de sua imagem no espelho. Como experiência, colocamos um galo índio, conhecido como galo de briga, diante do espelho. Cada vez que ele se olhava, ficava vermelho, arrepiava as penas e atacava o espelho. Esta experiência foi feita várias vezes e, em todas, ele tinha a mesma reação. Podemos citar, também, outra experiência salientada por Guillarme (1983) com chipanzés. Ao se depararem com sua imagem refletida, eles passavam a mão no espelho, olhavam atrás, e, como não viam nada, perdiam o interesse por ela.
A criança, ao contrário, usa o espelho como fator de conhecimento de si, raciocina, descobre seu eu, desenvolve seu esquema corporal.
Lacan (in Ajuriaguerra, 1980, p. 340) foi um dos pioneiros a salientar o estágio do espelho como fundamental para o desenvolvimento do esquema corporal. Para ele, a criança, até mais ou menos seis meses de idade, possui uma visão de corpo fragmentado, retalhado, e com a imagem especular começa a se ver de forma integrada, organizada, como um todo. Ele afirma:


A imagem se percebe como uma forma humana na qual ela reconhece, ao mesmo tempo, ela mesma e o outro. É a partir desta imagem especular que se resolve o mal-estar ansiogênico de seu corpo fragmentado e que ele vai construir e reger o mundo; esta imagem de corpo desmembrado, projetado em diferentes segmentos, é substituída, então, pelo sentimento de ser um, afetiva e fisicamente, ainda que o outro se imiscua constantemente.

Para Lacan, a identificação da criança no espelho constitui uma alienação inicial pelo fato de ela se identificar com uma imagem e não consigo mesma, mas isto 6também permite-lhe um acesso ao mundo da linguagem, facilitando assim que se realize a função do eu. Além disso, o espelho também oferece à criança um acesso ao simbolismo, pois organiza, unifica sua visão de corpo fragmentado, percebe-se como um eu, sujeito do discurso.
Wallon contrasta com idéias de Lacan de um corpo fragmentado que se reuniria no espelho. Para Wallon, a imagem do corpo se constrói progressivamente, por um processo de amadurecimento neurofisiológico da criança. O reconhecimento da própria imagem do corpo, depois da imagem do corpo de quem está próximo é um processo9 tônico-postural. Para ele, uma criança sente prazer em se descobrir, em se tocar. Percebe os objetos que são colocados sobre sua perna, seu braço, sua mão e, por fim, sobre seu tronco. O( espelho representa uma ajuda que facilita o aparecimento das “identificações sucessivas” em que ela se identifica, se distingue das coisas e, por fim, do resto do mundo que ora dominar mais tarde. Tudo isto a criança consegue realizar por um processo de maturação, e passa por um processo de conscientização progressiva do corpo próprio como uma realidade distinta do meio circundante.

DOLTO E NASIO


Dolto e Nasio (1991), em uma visão psicanalítica, falam de uma imagem inconsciente do corpo que desapareceria com a imagem especular. Eles também opõem-se a Lacan quando este diz que o espelho marca a passagem de uma imagem fragmentada, para uma imagem especular globalizante. Para eles, o que existe antes é uma imagem inconsciente do corpo. A imagem especular, então, contribuiria para modelar e individualizar a imagem inconsciente.
Dolto lembra a criança cega que não tem oportunidade de se confrontar com sua imagem visual, o que levaria a supor que teria dificuldade em assumir o esquema corporal. Segundo a autora, a criança cega conserva uma imagem inconsciente do corpo mais rica, no entanto, esta permaneceria inconsciente mais tempo do que nas crianças que enxergam.
Dolto e Nassio ainda salientam o cuidado que se deve tomar com a experiência do espelho. Um adulto tem que estar ao lado da criança para lhe explicar que o que vê é somente uma imagem, assim como o adulto ao lado é uma imagem no espelho. O outro, portanto, deve estar junto para que ela verifique uma imagem diferente da sua e que descubra que ela é uma criança. Para sabê-lo é preciso que olhe no espelho e constate a diferença entre a sua imagem e a do adulto. Nasio salienta que a imagem especular tanto pode integrar quanto abolir a imagem inconsciente do corpo.

LE BOULCH


Já Le Boulch (1984) acredita que uma criança diante do espelho observa seu corpo, que lhe parece estranho, estuda-o, explora-o e paulatinamente vai comparar seu corpo cinestésico com as reações posturais e gestuais que ele vê no espelho e que ainda lhe são estranhas – e aos poucos vai perceber que o corpo que sente é o mesmo que observa no espelho.
Tanto Zazzo (in Guillarme, 1983) quanto Guillarme vêem o espelho como fator de conscientização de si, mas Guillarme vai mais além, pois afirma que a experiência do espelho confronta a criança com a questão da identidade e, portanto, possui um papel decisivo da intersubjetividade na construção do esquema corporal. Para ele, o próprio esquema corporal tanto quanto uma realidade é uma imagem, pois, quando pedimos a uma criança para mobilizar a imagem de seu corpo, dirigimo-nos tanto a uma imagem esquecida, mitológica, fantasmática quanto a uma representação intelectual, claramente elaborada.
A experiência do espelho, portanto, constitui uma fase muito importante na confrontação da criança consigo mesma e como parte do processo de identificação. Como já ressaltamos, o corpo é um meio de que a criança dispõe para se expressar, para se comunicar com o mundo que a rodeia e é natural que ele assuma um caráter tão fundamental.
Para muitas pessoas, a experiência do espelho não termina neste período. É sempre um fator de conhecimento de si – não somente na infância, quando possibilita uma maior integração das imagens proprioceptivas, como também na puberdade, como auxiliar na formação da auto-imagem e da visão de si mesmo – da qual a imagem corporal é parte integrante.

ADOLESCÊNCIA


Na adolescência, com a emergência das mudanças físicas, o jovem, muitas vezes, sente-se desorientado. Um corpo que se modifica rapidamente acaba por abalar sua estrutura de eu, pode abalar seu esquema corporal, pois seu corpo serve como ponto de referência no espaço.
De início ele se vê em contínuas mudanças e questiona constantemente seu corpo até o momento em que se aceita (ou se espera que se aceite) e passa a viver em harmonia com ele. Neste momento, o espelho é seu grande aliado (ou inimigo). Ele se olha constantemente, estuda seu melhor olhar, seu sorriso mais sedutor, treina posturas, faz poses para analisar qual melhor imagem que quer passar para os outros. Ele usa o espelho, portanto, como elemento reforçador da formação da sua auto-imagem. Ele precisa se sentir bem com a imagem corporal que vê e sente para melhor se contactar com o meio.

ETAPAS DO ESQUEMA CORPORAL

Neste tópico abordaremos as três etapas do esquema corporal propostas por Lê Boulch e que, a nosso ver, traduzem o cerne da teoria psicomotora.

CORPO VIVIDO


1ª ETAPA: CORPO VIVIDO (até 3 anos de idade)


Esta etapa corresponde à fase da inteligência sensório-motora de Jean Piaget. Um bebê sente o meio ambiente como fazendo parte dele mesmo. Não tem a consciência do “eu” e se confunde com o espaço em que vive. À medida que cresce, com um maior amadurecimento de seu sistema nervoso, vai ampliando suas experiências e passa, pouco a pouco, a diferenciar de seu meio ambiente. Nesse período a criança a criança tem uma necessidade muito grande de movimentação e através desta vai enriquecendo a experiência subjetiva de seu corpo e ampliando a sua experiência motora. Suas atividades iniciais são espontânea, isto é, não pensadas.
De início, portanto, a criança passa pela fase de vivência corporal. Ela corre, brinca, trabalha seu corpo, passa pelo que De Meur (1984, p. 13) chama de atividade espontânea ( dos brinquedos) para uma atividade integrada. De Meur afirma que ela passa pela fase de conhecimento das partes de seu corpo sentindo interiormente cada segmento e vendo cada segmento dela em um espelho, em uma outra criança e em uma figura.
Esta etapa, portanto, é dominada pela experiência vivida pela criança, pela exploração do meio, por sua atividade investigadora e incessante. Ela precisa ter suas próprias experiências e não se guiar pelas do adulto, pois é pela sua prática pessoal, pela sua exploração que se ajusta, domina, descobre e compreende o meio. Este ajuste significa que a criança, mesmo sem a interferência da reflexão, adequa suas ações às situações novas, isto é, desenvolve uma das funções mais importantes que é a “função de ajustamento”.
Esta adquire também uma verdadeira memória do corpo a qual, por sua vez, é responsável pela eficácia dos ajustamentos posteriores.

CORPO PERCEBIDO OU DESCOBERTO


2ª ETAPA: CORPO PERCEBIDO OU “DESCOBERTO” (3 a 7 anos)


Esta etapa corresponde à organização do esquema corporal devido à maturação da “função de interiorização”, aquisição esta de suma importância porque auxilia a criança a desenvolver uma percepção centrada em seu próprio corpo. Le Boulch (1984b, p.16)define a função de interiorização como “a possibilidade de deslocar sua atenção do meio ambiente para seu corpo próprio a fim de levar à tomada de consciência”.
A função de interiorização permite também a passagem do ajustamento espontâneo, citado na primeira fase, a um ajustamento controlado que, por sua vez, propicia um maior domínio do corpo, culminando em uma maior dissociação dos movimentos voluntários. A criança com isto passa a aperfeiçoar e refinar seus movimentos adquirindo uma maior coordenação dentro de um espaço e tempo determinado.
Ela percebe as tomadas de posições e associa seu corpo aos objetos da vida quotidiana. Ela chega à representação mental dos elementos do espaço e isto é possível graças à primeira fase de descoberta e experiências vividas pela criança. Ela descobre sua dominância e com ela seu eixo corporal. Passa a ver seu corpo como um ponto de referência para se situar e situar os objetos em seu espaço e tempo. Este é o primeiro passo para que ela possa, mais tarde, chegar à estruturação espaço-temporal.
Ela tem acesso a um espaço e tempo orientado a partir de seu próprio corpo. Chega, pois, à representação dos elementos de espaço, descobrindo formas e dimensões. Neste momento assimila conceitos como embaixo, acima, direita, esquerda. Adquire também noções temporais como a duração dos intervalos de tempo, de ordem e sucessão, isto é, o que vem antes, depois, primeiro, último.
No final desta fase, diz Le Boulch citando Ajuriaguerra, o nível de comportamento motor bem como o nível intelectual pode ser caracterizado como pré-operatório, porque está submetido à percepção num espaço em parte representado, mas ainda centralizado sobre o próprio corpo
.

CORPO REPRESENTADO




3ª ETAPA: CORPO REPRESENTADO (7 a 12 anos)



Nesta etapa observa-se a estruturação do esquema corporal. Até este momento, a criança já adquiriu as noções do todo e das partes do seu corpo (que é percebido através da verbalização e do desenho da figura humana), já conhece as posições e consegue movimentar-se corretamente no meio ambiente com um controle e domínio corporal maior. A partir daí, ela amplia e organiza seu esquema corporal.
No início desta fase a representação mental da imagem do corpo consiste numa simples imagem reprodutora. É uma imagem de corpo estática e é feita da associação estreita entre os dados visuais e cinestésicos. A criança só dispõe de uma imagem mental do corpo em movimento a partir de 10/12 anos, significando que atingiu “uma representação mental de uma sucessão motora”, com a introdução do fator temporal (Le Boulch, 1984a, p. 20)
Sua imagem de corpo passa a ser antecipatória, e não mais somente reprodutora, revelando um verdadeiro trabalho mental devido à evolução das funções cognitivas correspondentes ao estágio preconizado por Piaget de “operações concretas”.
A imagem do corpo representado permite à criança de 12 anos “dispor” de uma imagem de corpo operatório que é o suporte que a permite efetuar e programar mentalmente suas ações em pensamento. Torna-se capaz de organizar, de combinar as diversas orientações.
Outro fator que Le Boulch apresenta, como correspondente ao estágio das operações concretas, é a passagem da centralização do corpo, isto é, da percepção de um espaço orientado em torno do corpo próprio à descentralização, à representação mental de um espaço orientado “no qual o corpo está situado como objeto”.
Isto quer dizer que os pontos de referência não estão mais centrados no corpo próprio mas são exteriores ao sujeito, podendo ele mesmo criar os pontos de referência que irão orientá-lo.




Bibliografia: OLIVEIRA, Gislene de Campos. Psicomotricidade: Educação e Reeducação num enfoque Psicopedagógico. Petrópolis, RJ: Vozes, 1997. p.47 a 61.